ARTE: ARQUITETA CAROLINA LIMA

Um Blog feito pelos leitores

sábado, 5 de setembro de 2009

ESPAÇO DA POESIA - VINICIUS DE MORAES


BALADA DO MANGUE


Pobres flores gonocócicas

Que à noite despetalais

As vossas pétalas tóxicas!

Pobre de vós, pensas, murchas

Orquídeas do despudor

Não sois Loelia tenebrosa

Nem sois Vanda tricolor:

Sois frágeis, desmilingüidas

Dálias cortadas ao pé

Corolas descoloridas

Enclausuradas sem fé.

Ah, jovens putas das tardes

O que vos aconteceu

Para assim envenenardes

O pólen que Deus vos deu?

No entanto crispais sorrisos

Em vossas jaulas acesas

Mostrando o rubro das presas

Falando coisas do amor

E às vezes cantais uivando

Como cadelas à lua

Que em vossa rua sem nome

Rola perdida no céu...

Mas que brilho mau de estrela

Em vossos olhos lilases

Percebo quando, falazes

Fazeis rapazes entrar!

Sinto então nos vossos sexos

Formarem-se imediatos

Os venenos putrefatos

Com que os envenenar

Ó misericordiosas!

Glabra, glúteas cafetinas

Embebidas em jasmim

Jogando cantos felizes

Em perspectivas sem fim

Cantais, maternais hienas

Canções de cafetinizar

Gordas polacas serenas

Sempre prestes a chorar.

Como sofreis, que silêncio

Não deve gritar em vós

Esse imenso, atroz silêncio

Dos santos e dos heróis!

E o contraponto de vozes

Com que ampliais o mistério

Como é semelhante às luzes

Votivas de um cemitério

Esculpido de memórias!

Pobres, trágicas mulheres

Multidimensionais

Ponto morto de choferes

Passadiço de navais!

Louras mulatas francesas

Vestidas de carnaval:

Viveis a festa das flores

Pelo convés dessas ruas

Ancoradas no canal?

Para onde irão vossos cantos

Para onde irá vossa nau?

Por que vos deixais imóveis

Alérgicas sensitivas

Nos jardins desse hospital

Etílico e heliotrópico?

Por que não vos trucidaisó inimigas? ou bem

Não ateais fogo às vestes

E vos lançais como tochas

Contra esses homens de nada

Nessa terra de ninguém!

Nenhum comentário: