ARTE: ARQUITETA CAROLINA LIMA

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segunda-feira, 26 de julho de 2010

HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

Praia de Riacho Doce, onde Ordener viveu e Zé Lins do Rego se inspirou para escrever o romance “Riacho Doce”.

ORDENER CERQUEIRA
Ordener foi meu ídolo na infância e juventude. Eu me divertia, dava gargalhada ouvindo suas histórias. Amigo da família, dentista, consultório na Rua Boa Vista, ele costumava contar, quando eu era menino, meu pai, Coronel Mário Lima, trazia um batalhão de soldados para me segurar e abrir minha boca. Assim ele conseguiu tratar meus dentes.
Ordener foi o inventor do pastoril dos estudantes. Nas vésperas de Natal, vários estudantes dançavam o pastoril fantasiados de pastoras. Ele era a vedete, a contramestra, a primeira pastora do cordão azul.
CAPIBA
O poeta, ator, compositor, Aldemar Paiva, certa vez trouxe à Maceió, Capiba, o maior compositor nordestino do século XX, dentre suas grandes músicas, “Serenata Suburbana”, era o sucesso daquela época, e uma das músicas prediletas de Ordener. Aldemar levou Capiba numa tarde sábado à casa de Ordener, praia de Riacho Doce. Ao ser apresentado ao compositor, Ordener perguntou que música Capiba compôs, ele imediatamente cantarolou: “Levo a vida em serenata... Somente a cantar... Quem não me conhece... Tem a impressão... De que eu sou tão feliz...” Ordener arregalou os olhos vendo a simpliciade, o jeito matuto de Capiba, não acreditou. Disse na cara: “Duvido que você fez essa música, aqui óh!.” Assim passaram a tarde conversando, Ordener, Capiba e Aldemar Paiva. Tarde alegre e antológica. Capiba costumava dizer, Ordener era o cara mais engraçado que havia conhecido. O PROFESSOR PREGUIÇOSO
Ordener estudou no Liceu Alagoano. Havia um indolente professor, nunca ficava em pé, dava aula sentado, por mania colocava a mão esquerda na primeira gaveta do bureau enquanto falava lerdo aos alunos. O preguiçoso professor passava a aula num palavreado monocórdio provocando sono. Sempre sentado com a mão enfiada na gaveta.
Certo dia, no quintal da casa de Ordener apareceu um baita goiamum, azulado, brabo, com uma pata maior que o casco. Ele conseguiu segurar e amarrar o caranguejo, acondicionou, embrulhou o goiamum em fibras de bananeira. Dia seguinte levou-o para o Liceu. No intervalo, antes da aula chata do professor preguiçoso, Ordener desembrulhou, soltou o arisco caranguejo na gaveta, fechando-a.
O professor com cara de sono iniciou a aula. Sentou-se na confortável poltrona. A certa altura, devagar, abriu a gaveta, enfiou o braço. De repente deu um grito enquanto puxava a mão com a enorme pata do caranguejo travada no indicador. O professor berrava apavorado, pedia socorro, enquanto a alunada vibrava, se deliciava às gargalhadas. Acudiram, conseguiram abrir a pata presa no dedo. O professor aproveitou não deu mais aula, prometeu expulsar o meliante que colocou o caranguejo na gaveta.
TIO NAPOLEÃO
Meu tio Napoleão Peixoto, amigo de infância de Ordener, estava há 20 anos sem vir a Maceió. Certo verão veio com a família, primeira providência, ver Ordener, me pediu para levá-lo a seu consultório. Chegamos por volta de 11 horas da manhã na Rua Boa Vista. Napoleão sentou-se discretamente, bati à porta. Ao me ver ele ficou feliz, perguntou o motivo da inesperada visita enquanto tratava os dentes de um moreno sentado, aliás, deitado na cadeira, de boca aberta. Era uma surpresa. No mesmo instante, Ordener deixou o cara com a cara para cima, pendurou a broca, limpou as mãos, sorrindo, me perguntava qual a surpresa. Apontei meu tio Napoleão sentado numa cadeira, a alegria foi tamanha ao reconhecer seu amigo de juventude que se abraçaram chorando com todo o sentimento do mundo guardado durante 20 anos. O encontro emocionou a todos.
Ordener tirou a bata de dentista, imediatamente convidou para tomar “uma”, comemorar o encontro. Descemos até o Bar do Chope. Brindamos, entornamos algumas cervejas. Tempo depois chegou a atendente, lembrando, o negão ainda estava lá de boca aberta. Ele mandou recado: estava muito emocionado, pedia desculpas aos clientes, não tinha condições psicológicas em atendê-los.
O encontro estendeu-se à madrugada no Bar das Ostras, à beira da Lagoa Mundaú, cantando, violão de Marcos Vinicius; “Ai, ai, que saudade ai que dó... viver longe de Maceió... As noitadas felizes nas Ostras... bons amigos que choram até... que saudades da Bica da Pedra... e dos banhos lá do Catolé...”.

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