ARTE: ARQUITETA CAROLINA LIMA

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domingo, 26 de setembro de 2010

CRÔNICA DO POETA LEDO IVO PARA A "REVISTA VEJA, COMER E BEBER -2010-2011"

O país dos alagoanos

Lêdo Ivo

O brasão de Alagoas, o país dos alagoanos, foi dado por Maurício de Nassau no século XVII, durante a ocupação do Nordeste pelos holandeses, quando o Brasil não existia, pois era a colônia abandonada de um Portugal incorporado à Espanha. Esse brasão consiste em “três tainhas postas em pala no campo verde do escudo”. A terra em que fui nascido era, então, a Alagoa Australis (rica em pescado).

Ilustração: ATTÍLIO

Na raiz de sua origem estão as águas, daí o seu nome airoso. Estão as águas e os peixes e todos os frutos do mar e dos rios, dos riachos e das lagoas. São eles e elas que atraem o turista sedento de praia e sol, que pode ir caminhando no mar até os currais de peixes como se pisasse terra firme. E, de volta desse passeio que também pode ser feito numa jangada, sentir a força do vento e ser rodeado pelo mormaço, num envolvimento quase sexual.

Maceió é uma palavra indígena. Significa pântano ou alagadiço (é a mesma origem etimológica de outra cidade ilustre: Paris). É o Brasil litorâneo das terras moles misturadas com as águas do mar, lagunas, rios, riachos e chuvas. Os manguezais e coqueirais, as mangueiras gordas e os cajueiros floridos guardam multidões inumeráveis de siris, caranguejos e goiamuns, habitantes dessa terra escura, lamacenta e peganhenta que se agarra amorosamente aos nossos pés. As dunas parecem querer engolir-nos.

Embora as três tainhas do brasão simbolizem o nosso lugar de nascimento, esse peixe de tradição preclara não está sozinho no nosso cardápio. Quem visitar a chamada República das Alagoas — tão invejada pelos poetas e escritores de outras plagas e tão caluniada pelos imaginosos colunistas políticos — poderá deleitar-se, nos restaurantes ou nos botecos de praia, com uma profusão de delícias. Às gulas estrangeiras, oferecemos carapebas, cavalas, camarões, bagres do Pilar, egrégias galinhas ao molho pardo, temperos embriagadores que têm como base a pimenta dedo-de-moça, pitus e siris, farofa de bolão, manteiga de garrafa vinda do sertão, cervejinha gelada destinada a “limpar a serpentina”, água de coco anão que limpa até as impurezas da alma. E cachaças de alta estirpe cujo tira-gosto é um pedaço de caju no palito. E a carne de sol também vinda do sertão. E, por último, imperando entre tantos pratos admiráveis, o sururu, suprema dádiva lagunar, referência incomparável de nossa alagoanidade.

Só em Maceió e em Paris (onde atende pelo nome de moule) podemos comer e até nos empanturrar desse mexilhão, cuja existência é uma prova incontestável da existência de Deus. É por isso que, quando estou em Paris, me sinto em casa. Lá me espera sempre o capitoso sururu de capote de minha infância e de minha cidade bem-amada.

Um turista não vai a Maceió só para comer ostra ou lagosta e nadar no seu mar azul e verde. Vai para descobrir um Brasil diferente, apreciar as moças em flor que falam cantando, divertir-se na prodigiosa Feira do Rato, contemplar os anjos bochechudos das suas igrejas, andar pelas casas corcundas das ruas tortas do centro da cidade. E conhecer um povo que, apesar da cruel lenda sulina, tem um coração de manteiga derretida.

Um comentário:

Itzac Landauer disse...

Je n'ai jamais eu le plaisir de con
naitre le Prince des poetes alagoa-nos, mais j'ai eu le plasir de lire
ses belels traductions de Rimbaud.
Une amie, Susana Geyerhann, a eu plus de chance car elel le connais-
sais personellement et disait qu'il etait tres intelligent. Son article sur ma Balbec tropicale est
tre bien ecrit, c'est superbe! J'ai
merais lui ecrire; aurriez-vous la bonte de m'envoyer son addresse?