ARTE: ARQUITETA CAROLINA LIMA

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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA


AZUL X ENCARNADO

Céu azul, nuvens brancas passageiras, coqueiros altos, elegantes, balançando ao vento, manhã de sol. À beira-mar jovens correm molhando os pés, levantando água, outros se deitam em toalhas, início de um belo domingo. Domingo cívico, falta uma semana para o segundo turno das eleições. Carros desfilam com adesivos de candidatos, jovens tremulam bandeiras coloridas. Os verdes já não existem. Na guerra eleitoral restaram azuis e encarnados. A Polícia interrompeu o trânsito, o asfalto é tomado pelos empolgados eleitores coloridos. Na praia da Jatiúca a democracia é uma festa.
Dos prédios envidraçados caem faixas, banners, mostrando a opção de voto. A maioria dos passantes se manifesta pelas cores, poucos indecisos. Camisa azul (Téo Vilela – Serra) ou encarnada (Lessa – Dilma), os adversários contam vantagens, não admitem derrota. Na história política das Alagoas jamais houve batalha igual. Gritos, músicas, bandeiras, alegria, no ar.
Ao meio dia, de cada extremidade da orla partem os candidatos, a multidão acompanha. De cima do trio-elétrico, acenos, beijos, e abraços, o povo levado pela emoção, vibra com entusiasmo.
Como pastoril na festa do natal, dois cordões distintos, o azul e o encarnado, é a festa da democracia. Alguns eleitores desencantados com a baixaria pensam votar em branco, entretanto, ao ver passar a multidão entusiasmada, toma partido.
Barracas de praia repletas, cerveja e uísque rolam, fazem a alegria dos boêmios, dos frequentadores, curtidores do domingo de sol assistindo de camarote a festa passar.
Nesse cenário, no meio da festa popular, João avistou Maria. Ele segurava uma bandeira vermelha, número “12”, ganhava um trocado para sobreviver ao domingo. Alegrou-se ao ver Maria com uma bandeira azul, “45”. Antiga namorada, Maria havia desaparecida de sua vida. Gritou. Ela parou, reconheceu João. Abraço prolongado, olhos nos olhos.
- Como você está bonita, menina!
- Você também, corado! É o sol, para ganhar um dinheirinho tem que trabalhar, não é? Vou ficar até às quatro da tarde e você?
- Também termino às quatro. A gente bem que poderia se encontrar para uma cervejota, que tal?
- Pode ser, vamos marcar nesse lugar às cinco horas, está bem?
- Tudo bem Maria. Aqui para nós! Eu estou trabalhando com a bandeira vermelha do Ronaldo, mas vou votar no azul, no Téo!
- A mesma coisa, cara. Estou com a bandeira do Téo, mas vou votar no Ronaldo! Às gargalhadas ainda falou ao se afastar- Aqui às cinco, não falhe!
Os dois, felizes da vida, voltaram aos seus postos, cada qual de um lado da avenida.
Movimento crescente na rua, helicópteros cruzavam os ares filmando a multidão embevecida, empolgada. Desfile de uma população esperançosa de uma vida melhor para seus filhos, seus netos.
Ah! Se todas as promessas dos políticos fossem cumpridas, pensava João enquanto lembrava Maria, foi e é ainda a paixão de sua vida. Ansiava os carinhos de sua primeira namorada, aquela a quem nunca esquece. Encontraria Maria ao entardecer, seus caminhos se cruzaram novamente. João pensava em sua bela enquanto bandeiras se agitavam nas ruas. Os gritos e as músicas não calaram as últimas palavras de Maria, “Às cinco, Não falhe!”
Passavam das três horas quando a multidão começou a se dispersar, cada qual para seu canto, pobres, ricos, velhos e jovens se misturavam. Uma eleição representa sempre a esperança de um mundo melhor, justiça, paz e amor, gêneros de primeira necessidade, que todos tivessem direito, assim via as coisas, assim pensava João.
Na hora marcada se encontraram. Os alegres jovens atravessaram o asfalto, compraram quatro latinhas de cerveja, desceram à beira-mar. O entardecer recebia um prêmio, uma lua prata minguando no céu alaranjado.
Na areia branca estenderam as bandeiras, a azul e a encarnada, ainda em pé se beijaram. Beijo prolongado, carinho e amor ao escurecer. Deitaram por sobre as bandeiras. Maria alisou a cabeça do primeiro namorado, o retorno depois de dois anos afastados. Cantarolou a canção de “João Valentão”: “E assim adormece esse homem... Que nunca precisa dormir pra sonhar... Porque não há sonho mais lindo... Do que sua terra não há.” Amaram-se em cima do azul e encarnado, os trocados ganhos no trabalho foram trocados em cerveja. Valeu à pena, ficaram até o domingo acabar

Um comentário:

Anônimo disse...

Amei o texto, Carlito. Olívia. bjs